Tenho um amigo, por sinal bastante chegado, que é talvez um dos melhores músicos clássicos portugueses no seu instrumento. Já tocou com todas as grandes orquestras portuguesas, algumas vezes como
solista, e tem uma carreira bem cimentada. Curiosamente, é um gajo bem porreiro, um patusco que recebe em casa pessoal de todo o mundo para umas tainadas à antiga e que apresenta um respeito imenso pelos
músicos sem formação clássica.
Desde há anos, tenho-lhe mostrado o trabalho cultural e social feito pelas tunas e contado umas histórias do meu percurso de
tuno boémio, que ele vai acompanhando sem qualquer paternalismo artístico. Não será propriamente um amante de tunas, mas reconhece a importância de cada género musical, espaço artístico ou fenómeno cultural (como queiram). Infelizmente, moramos bastante afastados e nunca calhou levá-lo a um evento com tunas.
Ligou-me no passado domingo para contar uma história que, verdadeiramente, me envergonhou. Nesse fim-de-semana, andou a ensaiar com uns músicos estrangeiros que vieram a
Portugal e, por acaso, foram beber um copo logo depois de um
ensaio, carregando, ainda, os seus instrumentos. Do grupo de músicos estrangeiros, faziam parte umas moças de vinte e tal anos, pelos vistos bastante engraçadas. Já num determinado bar, a partir da mesa do lado, um grupo de malta meteu conversa com o grupo do meu amigo e disseram que também eram músicos e que eram da
tuna X. Por coincidência, algumas das
músicas que eu lhe havia mostrado eram dessa tuna, pelo que o meu amigo até lhe conhecia o nome.
O que se passou de seguida foi um ataque cerrado às miúdas jeitosas de vinte e tal anos por malta de quase quarenta anos, em termos pouco dignificantes. Em inglês, mandavam piropos tão elevados como “vem mas é para esta mesa para levares umas palmadas”, “eu fazia-te isto e aquilo”, perante o ar espantado e envergonhado desse meu amigo, que não é propriamente um menino ou um monge…
Acrescento apenas que ele começou o telefonema em que me contou a história com um
“Encontrei uns amigos teus…” e terminou com um
“Ainda bem que não fui eu que escolhi o bar!”. E ainda comentou:
“Realmente há malta que envelhece mal...”.
Pedi-lhe desculpa, apesar de nada ter que ver com o caso, e fiquei a pensar se não lhe havia andado a contar
histórias da carochinha todos estes anos…
Mais um rombo no
Titanic.
Tiago Alegre